quinta-feira, abril 06, 2006

10 passos "mágicos" (como o puré!) para fazer um livro fantasy rentável

Certamente todos já se aperceberam que os livros fantásticos tomaram, hoje em dia, o lugar, tão bem mantido durante anos, dos livros “pré-adolescentes pseudo-detectives que se metem em sarilhos, malvados dos gaiatos!” nas prateleiras dos nossos jovens (que por estes dias é como quem diz dos 12 aos 25 ou, se puder ser, até mais).
Ora, como não podia deixar de ser (porque quem manda sou eu) também estes marcos literários têm uma fórmula. Tudo o que é produzido em massa tem uma fórmula, obviamente. Venham comigo nesta viagem desde o Harry Potter até ao Dungeons & Dragons passando por essa grande “Saga dos Calhaus Mágicos”!

1- Arranjem um mundo. Sim, porque antes de haver gente tem de haver um mundo. É da praxe. Uma coisa assim com poucos continentes, um ou dois está óptimo. Podem arranjar, no entanto, uma ilha assim para o grandita, que dá jeito para criar povos místicos com costumes estranhos. Vejam os australianos…
Nestes dois continentes cruzam-se os climas mais estranhos, uns ao lado dos outros. Aliás, quanto mais extremos forem, mais próximos devem estar! Vulcões activos rodeados de neve, florestas tropicais em cima de montanhas, pântanos no meio do deserto, cidades onde cai chuva ácida! Bem este último se calhar é um bocadinho extremo demais…
Lembrem-se que a diversidade climatérica e paisagística é muito importante para quebrar a monotonia e ver como os nossos heróis vivem com a adversidade, deixando ao critério do leitor imaginar aqueles detalhes de somenos importância como por exemplo qual é exactamente o cheiro de uma pessoa depois de 2 semanas num pântano sem tomar banho ou será que piolhos e chatos emigram e convivem, podendo dar origem a híbridos com toda aquela imundice? O que são as leis naturais comparadas com estas questões…

2- Povos. O pacote básico é: elfos, anões, humanos, orcs e monstros variados para encontros fortuitos de modo a ganhar pontos de experiência. Ai, perdão, isso não é nos livros. Nos livros é monstros: malta feia e babona que, devido a rumores infundados, “parece que come pessoas ao jantar.” Tendo estes povos como base depois é pedir raças “emprestadas” do Warcraft ou do Morrowind , alterar uns nomes aqui e ali para dar ares de novidade, inventar sub-espécies ou roubar as dos outros escritores, armar-se em geneticista e criar bicharada que se existisse seria maioritariamente como nados-mortos.
Passemos então às características culturais. São muito simples. O princípio base é: toda a gente se julga um máximo e ninguém gosta de ninguém.

Elfos: As estrelas dos fantasy. Imortais, sábios, sempre maquilhados, sempre penteados e com muito pouco tempo para gentinha. Não há ninguém tão bonito ou tão fixe como eles e eles sabem-no, como o comprovam o Legolas, o Mr. Smith e o Dobby (O Dobby? Pois claro que sim. Ele foi em tempos Mister Universo Conhecido, antes de todo aquele trabalho doméstico o desfigurar). Não gostam particularmente de nenhuma raça (Especialmente dos anões. Sendo o desprezo mútuo) pelo simples facto de que todos eles são terrivelmente feios. É justo.

Hobbies: dar ares de místicos, hobbie que lhes ocupa a maior parte do tempo e que se torna terrivelmente extenuante ao longo da eternidade, ocasionalmente interrompido pelo passatempo, menos frequente, de fazer humanos se apaixonarem loucamente por eles.


Humanos: Bem esta é fácil. Tudo o que o bom homem católico da época medieval fosse, pensasse e fizesse é sancionado pelos estudiosos de fantasy comportamental. Por outro lado tudo o que a boa mulher católica da época medieval não fizesse (ou não a deixassem fazer) é o adequado ao género feminino. Isto torna a existência de guerreiras frequente não eliminando no entanto, como seria de esperar, o machismo em relação a isso, sendo assim alvo comum de discussão entre o herói e o seu interesse romântico como relatarei mais lá para a dianteira deste manual magnífico. Sim porque as mulheres passam a ser guerreiras mas os homens não passam a ser donos-de-casa! Queriam!
Esqueçam o monoteísmo. Muitos deuses para toda a gente! Deus do vinho, deus do amor, deus da guerra, deus das farpas enfiadas naquela unha grande do pé, deus da sífilis e por aí a fora.

Hobbies: Muita guerra e muito sexo. Se possível os dois ao mesmo tempo.


Anões: Mineiros peludos e tal. No que toca a anões basta dizer que como eles vivem sempre enfiados debaixo da terra sabe-se pouco sobre os bacanos e fica o assunto resolvido. Afinal quem é que quer fazer um livro sobre anões?

Hobbies: Falar mal dos elfos e apanhar bebedeiras.


Orcs: Feios, nojentos e com mau feitio. Assim mais ou menos como os portugueses. Um bando de portugueses bigodaças que não tomam banho há 5 semanas, com 6 meses de salários em atraso e um jeito especial para retirar a felicidade das coisas à pancada.

Hobbies: rosnar para as câmaras no close up.


3- Herói/na – O personagem principal. A base do livro. O simpático/a de que toda a gente tem de gostar ou o livro torna-se insuportável. Costuma dar jeito ser humano ou, pelo menos, meio humano para o leitor se poder identificar com ele.
O herói nestas coisas costuma ser alguém que acha que é ninguém por variadas razões. Logo a seguir a ser humano esta é a característica que mais agrada aos leitores. Nada como um perdedor que triunfa para pôr toda a gente (especialmente os perdedores) feliz! É escolher. O leque de razões para fraca auto-estima é mais que extenso. Porque não é fisicamente apto, porque não tem boas notas na escola, porque vive no meio de nenhures (esta é muito popular), porque é 18º de 18 filhos, etc., etc., etc. Eventualmente acaba por descobrir, como o Neo, que é o “The One”, normalmente após a morte violenta dos seus entes queridos (todos se possível) e a destruição da sua aldeia. É muito importante a morte violenta e cruel de entes queridos porque é daquelas coisas que chateiam uma pessoa a sério, logo despertará a sede de vingança do nosso herói, que é tudo o que o motivará, aliada ao desejo de se afirmar como algo ligeiramente superior a musgo, pelo menos. Isto será a justificação perfeita para o facto dele conseguir derrotar os seus inimigos só com um pau, um braço partido, sem comer faz 4 dias amanhã e sem saber sequer lutar. É a raiva! É a dor! Grrrr!
Entretanto o processo de descobrir que é “O Tal” costuma passar por descobrir que tem algum destino fantástico inscrito numa profecia qualquer que não interessa a ninguém ou num par de estrelas mais escusas, que diz que ele terá de salvar o mundo da gripe das aves e ainda em cima ter de governá-lo a seguir. Ou descobrir que é o último espécime de uma raça mística ou que é herdeiro de um artefacto super hiper poderoso (espada, pedras mágicas, anel, livro, etc) que resolve qualquer problema e que só ele pode manejar ou ainda descobrir que é adoptado e afinal é filho do tirano da terra vizinha que por sua vez é um mutante que quer eliminar a raça dos pais adoptivos do nosso herói, pois eles têm um gosto invulgar por laranjas e o nosso tirano é mais homem de tangerinas, por razões a desvendar. Coisas simples estão a ver?
Uma coisa fundamental é o herói ser incrivelmente bonzinho e cheio de princípios morais ranhosos (Daqueles que ninguém tem. Só mesmo aqueles panfletos das Igreja Cristã do Senhor Jesuzito ou um paladino). Ah e nem é preciso dizer que tem de ser minimamente atractivo fisicamente, certo? Conhecem algum herói coxo ou com lepra? É por estas e por outras que o Quasímodo não ficou com a miúda. E não há nada mais chato que um herói/na sem um interesse romântico.

Na continuação do nosso manual não percam: o interesse romântico do herói, o seu gang de mal lavados e o sempre omnipresente e não tão inteligente como seria de esperar vilão!

Para o chato do Ludovico
CHESB

4 comentários:

Português desiludido disse...

Muito bom artigo!

Migas-o-Sapo disse...

Olá Dona Orc ! (Se não fores portuguesa, então desculpa aí o engano.)Epá, isto é genial! Já aí há tempos tinha sido aqui espetada uma coisa parecida só que com livros do género do "Código Da Vinci". Muito bem, continua, estou ansioso por ver o resto!

K1111 disse...

Sou portuguesa mas não tenho bigode, lá está XD Obrigado

E tu ludovico já devias de saber melhor do que elogiar-me dessa maneira descarada...

CHESB

Migas-o-Sapo disse...

Muito bem, tudo explicado. Por acaso, tive uma rapariga minha colega de escola já há uns bons aninhos que não era só bigode que tinha, era também um bocado de barba. Ao que parece, casou-se e teve um filho há pouco tempo. Bem, mas essa é já outra história. Cá espero pela segunda parte do teu manual. :)