Entramos nas livrarias hoje em dia e só nos entram olhos a dentro 2 tipos de livros: livros sobre conspirações religiosas e livros de fantasy (estes normalmente na secção juvenil, sobre os quais me irei debruçar, que é como quem diz, descascar em cima, depois, quando me der na veneta pensar nisso e falar mal do Harry Potter e das sagas dos calhaus mágicos).
Ora podendo não ser todos cópias do Código Da Vinci, já que a sua chegada às nossas bancas, após o êxito do mesmo, em nada se relaciona com a sua data de publicação, têm na maioria uma fórmula particularmente desinteressante em que muitos litros de tinta são desnecessariamente gastos a falar sobre a tanga que Cristo usou na crucificação ou a compulsiva malvadez e perfídia de todos os papas até João Paulo II que foi, obviamente, assim tão bom (em quê é que não sei muito bem) para compensar as maldades dos outros papas. Resumindo, faz-se um pouco do que se faz aqui pelo blog. Ora vamos lá com a tia CHESB saber os 10 passos básicos para seres o próximo Dan Brown da tua paróquia!
1 - Arranja um título com as palavras código, Cristo, templário, seita, Madalena, maçonaria, mistério, clube, assassino, irmandade (não é consigo senhor Tolkien! Volte lá para a campa se faz favor que ainda se constipa.) conspiração, enigma, relíquia, etc. Uma coisa que soe bem e a artigo do Tal e Qual. Algo assim: Mistério da relíquia do templário sagrado que conheceu Jesus, que assim conseguem vilipendiar logo uma série de instituições, pessoas e factos históricos, tudo em nome da boa literatura.
Também é aconselhável citações sem autor identificado (também conhecido como o responsável de marketing da editora) na capa, no género “ O melhor thriller (pseudo) histórico de ficção (????) desde o Código da Vinci” ou “ Um dos melhores thrillers de sempre, carregado de suspense intelectual.” (esta é verídica hã! E fico à espera da diferença entre o suspense intelectual e o suspense normal).
2 - Faz favor de arranjar uma capinha a puxar para o interessante. Com um ar de mistério, com silhuetas negras de pessoas escondidas atrás de postes, imagens que despertem curiosidade tiradas assim de livros da Wicca e um título em letras vermelhas escuras ou castanhas, tudo em tons escuros e pesados. Dourados também resultam muito bem. Uma coisa assim com ar de livro do século XX, feito no século XIX. A conspiração começa logo aqui.
3 - Agora é necessária uma boa seita/organização secretíssima (pode ser verídica ou não), com os rituais mais rocambolescos que te ocorram, que tem “a Verdade” mas não a dá a ninguém. É necessária também uma bela de uma gigantesca conspiração. Agora atenção aqui. Tem de ser uma conspiração religiosa que se enrole assim a modos que em planos para conquistar o mundo através de mensagens subliminares (que até podem vir de ETs, desde que sejam ETs medievais) e da ocultação de verdades universais que nos hão-de libertar a todos de qualquer coisa muito má que nos prende mas ninguém sabe muito bem o que é mas há quem já diga que é a nossa apetência natural para a ignorância e a cena de vivermos para comer e não comermos para viver. Algo assim.
4 – Depois é preciso um artefacto que toda a gente quer mas que ninguém apanha como deve de ser. Tem de ser um artefacto dos bons hã! Aqui também podes optar entre verídico ou não. Aconselha-se verídico para despertar a curiosidade e espevitar a atenção do leitor. Tem de ser um objecto envolto em mistério e dúvida, o mais antigo possível, cheio de espaço para especular, duvidar, profetizar, aldrabar, inventar, etc.
Um objecto, de preferência relacionado intimamente com as bases de alguma religião, que carregue consigo enigmas e puzzles melhores ainda que o Sudoku e cuja solução trará luz sobre segredos apocalípticos!
5 - Seguidamente é imperativo arranjar um(a) herói(na) caixa de óculos, com a profissão mais complicada de soletrar do mundo, com um “sidekick” do sexo oposto, para dar romance lá para o meio e um terceiro membro da “party” meio desajustado das ideias seja porque é um jogador de golfe com um fetiche por sudários ou porque é um monge budista dividido por resolver enigmas cristãos através de meditação e da comunhão com todas as criaturas, parecendo que se está a aproveitar do nirvana para ajudar gente que não é da laia dele.
6 – Templários! Tem de ter templários! Se mete o Leonardo Da Vinci então, tás safo!
7 – A Igreja Católica, por estranho, paradoxal e irónico que pareça é a encarnação do Diabo em forma de instituição. É pior que a Gestapo, é o FBI e a CIA juntos, é os serviços secretos de Israel mas com mau feitio. Quer dominar o mundo, tem assassinos, freiras, espiões e meninas insuspeitas com chupa-chupas a controlar e monitorizar o mundo para ela e está zangada. Está sempre muito zangada. Um bocadinho ao jeito de Deus no Antigo Testamento.
A Igreja Católica é um cão grande e a verdade sobre as suas historietas é o osso, guardado entre as suas patas (e dentes) ferozes. Toda a gente sabe isso mas é sempre bom lembrar, não é?
8 – É preciso misturar muito bem misturadinhas a realidade e a ficção de maneira a que o leitor não saiba onde começa uma e acaba a outra e acabe por acreditar em coisas que não devia. É basicamente o vale tudo, já que 99.9% dos leitores do teu livro não se vão dar ao trabalho de verificar a informação que lá consta. Assim, podes usar as mentiras como factos históricos e os factos históricos como mentiras e ainda juntar uma mão cheia de banha de cobra. Soa fixe? Então é fixe!
9 – Não escrevas muito, não canses as pessoas. À volta de 300/350 págs. já está muito bom.
10 – Arranja um final circular. Todas as tramas, voltas e reviravoltas, personagens e vilões foram desmascarados mas no final vai dar tudo ao mesmo porque as coisas ficam todas na mesma, com a excepção de uma ou outra personagem ferida de morte com veneno ou com o artefacto ou algo assim. Ainda ficámos mais burros do que quando começámos, com a única vantagem de que podemos ter adquirido (pelo menos aquele 0.01% de leitores) algum apetite para descobrir ao menos, posteriormente, a pontinha de verdade nisto tudo. Sem comprarmos O Código Da Vinci Descodificado se faz favor!
Aqui fica assim a fórmula mágica para muitos êxitos literários, para quem saiba pôr mais de duas palavras juntas e usar moderadamente bem o Google.
Ter fama de investigador e/ou Dr. em alguma coisa também ajuda. Por isso isto não é projecto para quando se tem 19, 20 anos.
Nunca a História foi tão divertida de inventar! CHESB